quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Democracia racial no Brasil ! Uma hipótese


Em 1949, no já citado "Brazil: racial amalgamation and problems", Gilberto Freyre utilizou pela primeira vez, a expressãodemocracia racial:



Para os reformadores, todos que o Brasil precisava era de importar alguns dos entãonovos liberal instituições europeias. Os realistas, no entanto, pensou que o Brasil,estimulada pela Europa liberal e pelos Estados Unidos, devem desenvolver suas própriasinstituições democráticas ou estilos. Um desses deve ser uma democracia racial, comonem a Europa nem os Estados Unidos foram, então, preparado para aceitar.
Repare-se que, nesse trecho, Gilberto não afirma categoricamente a existência de democracia racial no Brasil. Apenas refere-se à sugestão de alguém (ou dele próprio, isso não está bem claro), de que democracia racial poderia existir ou vir a existir no seu país tropical. Mais adiante, no mesmo artigo, outra vez Gilberto Freyre se refere a democracia racial:


Música e arte culinária contribuiu para a democracia étnica ou racial no Brasil, para Africano, e um índio certa forma, as contribuições passaram a ser aceitos por todos os brasileiros como valores brasileira, e não como música ou arte Negro Africano ou indiano.
Aqui, democracia racial (ou étnica) aparece já como algo realmente existindo no Brasil, embora em um contexto cultural (de culinária e arte) e não societário. E, também (o que se repetiria quase todas as vezes que a questão era levantada por Gilberto Freyre) acompanhada da expressão sinônima "democracia étnica".
Na Câmara dos Deputados, a 17 de julho de 1950, comentando a rejeição de hospedagem, ocorrida alguns dias antes, em um hotel da cidade de São Paulo, à coreógrafa e dançarina americana Katherine Dunham, "por ser pessoa de cor", discursou Gilberto Freyre:



Este é um momento - o ultraje à artista cuja presença honra o Brasil bravos - onde a salaem silêncio seria uma traição do nosso dever como representantes de uma nação que é oideal, embora nem sempre a prática da democracia racial, étnica, incluindo a , uma das razões para a sua vida, uma de suas condições de desenvolvimento.

Essa fusão de democracia racial com democracia étnica aparece de novo em "Ethnic democracy: the Brazilian example" (1963a), artigo em que Gilberto utiliza no título a expressão "democracia étnica" mas no texto não se atém completamente a isso e menciona democracia racial. São afirmações suas nesse trabalho:



Ninguém afirma que todos os brasileiros de todas as regiões, classes e culturas do paísestão livres de preconceitos em relação à raça, cor, classe, região ou. Esses preconceitosexistem. Mas falta-lhes a força daqueles em outros países que motivam atitudessegregacionist por parte das minorias dominantes vis-à-vis maiorias dominadas, ou por parte das maiorias intolerantes vis-à-vis as minorias mal tolerada. Assim, embora sejaverdade que não as sobrancelhas são levantadas quando se fala do Brasil como uma democracia étnica ou racial que ainda é imperfeito, o Brasil é realmente muito avançadosnesse sentido.
Ainda em 1963 há nova menção a democracia racial. O autor conclui The mansions and the shanties, a versão em inglês de Sobrados e Mucambos, com a seguinte frase: "For Brazil is becoming more and more a racial democracy, characterized by an almost unique combination of diversity and unity". É interessante que esta frase não consta da versão original de Sobrados e Mucambos, em português; ela foi acrescentada à versão norte-americana e não aparece nas posteriores edições brasileiras.
Aqui terminam as menções específicas de Gilberto Freyre a democracia racial que encontrei até agora. Acrescente-se apenas que algumas das referências a democracia social e a democracia étnica, acima transcritas, são verdadeiras referências a democracia racial. Por exemplo, dizer que democracia social é aquela onde não há restrições devidas ao nascimento ou "ao sangue" daspessoas, é praticamente falar de democracia racial. Ressaltem-se, também, as equivalências entre democracia étnica e racial.
Mas está na resposta que deu a uma pergunta bem específica sobre democracia racial, em entrevista de 15 de março de 1980, à jornalista Lêda Rivas (Rivas, [1980]1997), a mais longa e explícita manifestação de Gilberto Freyre sobre o assunto, e assim mesmo porque foi, digamos, provocado pela jornalista. Por essa razão, vale aqui a transcrição quase in totum. A pergunta de Lêda Rivas foi: "Até que ponto nós somos uma democracia racial?" E a resposta de Gilberto Freyre foi esta:





[...] democracia política é relativa [...]. Sempre foi relativa, nunca foi absoluta. [...] democracia plena é uma bela frase [...] de demagogos que não têm responsabilidade intelectual quando se exprimem sobre assuntos políticos. [...] os gregos aclamados como democratas do passado clássico conciliaram sua democracia com a escravidão. Os Estados Unidos, que foram os continuadores dos gregos como exemplo moderno de democracia no século XVIII, conciliaram essa democracia também com a escravidão. Os suiços, que primaram pela democracia pura, até há pouco não permitiam que a mulher votasse. São todos exemplos de democracia consideradas, nas suas expressões mais puras, relativas. [...] o Brasil [...] é o país onde há uma maior aproximação à democracia racial, quer seja no presente ou no passado humano. Eu acho que o brasileiro pode, tranquilamente, ufanar-se de chegar a este ponto. Mas é um país de democracia racial perfeita, pura? Não, de modo algum. Quando fala em democracia racial, você tem que considerar o problema de classe, se mistura tanto ao problema de raça, ao problema de cultura, ao problema de educação. [...] isolar os exemplos de democracia racial das suas circunstâncias políticas, educacionais, culturais e sociais, é quase impossível. [...] é muito difícil você encontrar no Brasil brasileiros que tenham atingido [uma situação igual à dos brancos em certos aspectos...]. Por que? Porque o erro é de base. Porque depois que o Brasil fez o seu festivo e retórico 13 de maio, quem cuidou da educação do negro? Quem cuidou de integrar esse negro liberto à sociedade brasileira? A Igreja? Era inteiramente ausente. A República? Nada. A nova expressão de poder econômico do Brasil que sucedia ao poder patriarcal agrário e que era a urbana industrial? De modo algum. De forma que nós estamos, hoje, com descendentes de negros marginalizados, por nós próprios. Marginalizados na sua condição social. [...]. Não há pura democracia no Brasil, nem racial nem social, nem política, mas, repito, aqui existe muito mais aproximação a uma democracia racial do que em qualquer outra parte do mundo. [...].

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